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Artigos | Gustavo de Oliveira

O dito pelo não dito

27/03/2024 - 04:48

Na semana passada o Presidente Lula reuniu todo seu Ministério para uma importante reunião de alinhamento, a primeira deste ano de 2024. O início do segundo ano de qualquer mandato de gestão é um momento quando são avaliados, basicamente, três fatores: se a percepção da população é melhor do que na eleição, se o governo decolou seus programas e metas e quais as perspectivas de futuro para o projeto político em que ele se insere.

No primeiro quesito, não há muito a comemorar. Três grandes pesquisas nacionais mostraram o brasileiro menos satisfeito com o próprio presidente e o Governo Federal como um todo em diversos aspectos. Para entender o que a pesquisa diz é preciso olhar os detalhes do que a pesquisa não mostra também.

Os argumentos de que a economia vai bem porque o PIB cresceu mais do que o esperado (quase 3%) em 2023, a inflação aparentemente cedendo para ir ao centro da meta de 4,5% a.a. estabelecida como referencial e a divulgação de que o desemprego se encontra em um dos níveis mais baixos da história, por exemplo, são verdades que precisam ser ditas e comemoradas, mas não contam toda a história econômica do momento.

O crescimento do PIB, por exemplo, foi fortemente impulsionado pelo agronegócio e pela exportação de commodities em 2023. Ele não contou com o apoio de vigorosos investimentos públicos (o governo central tem menos de 1% do seu orçamento destinado a investimentos) e nem se refletiu em um ambiente de extrema confiança de investidores e empresários de diversos setores da economia. Em resumo, a média da turma do crescimento foi boa, mas muitos alunos tiraram notas baixas.

Também é verdade que a inflação cedeu. Contudo, ao olharmos os detalhes, percebemos que a pressão inflacionária sobre os serviços - que crescem e não encontram profissionais disponíveis nem investimentos em modernização e produtividade - aumenta os custos diários das pessoas e das empresas. Além disso, o aumento do preço de vários alimentos em taxas maiores do que a inflação mostra que o custo de vida está subindo mais do que a renda dos brasileiros.

Em Cuiabá-MT, por exemplo, segundo o Instituto de Pesquisas e Análises Econômicas (IPF) da Fecomércio, o arroz e a batata subiram 35% e 32%, respectivamente, entre janeiro de 2023 e janeiro de 2024, o que torna a ida ao supermercado cada vez mais uma ginástica orçamentária para o brasileiro médio. E sabemos que esse comportamento dos preços não é exclusivo de Mato Grosso, mas também de vários outros estados do país.

O desemprego é baixo, também é verdade. Segundo o IBGE, a taxa média de desocupação no Brasil fechou o ano de 2023 em 7,8%, a menor desde 2014. Mas o IPEA mostra que o rendimento habitual médio real em dezembro de 2023 (R$ 3.100) foi 0,7% maior que o observado no mês anterior (R$ 3.078) e 3,9% superior ao valor de dezembro de 2022 (R$ 2.985). Os números mostram, novamente, que a renda não está acompanhando a despesa.

As altas taxas de juros também continuam fazendo seus estragos. O COPOM baixou a taxa SELIC para 10,75% a.a., mas com uma inflação esperada de 3,5% para o ano de 2023 esta redução não significa juros baixos. Em termos reais, a taxa de juros tem o triplo do tamanho da correção monetária projetada, fazendo com que dívidas e investimentos financiados no Brasil continuem sendo um dos mais caros do mundo.

Trocando tudo isso em miúdos, o presidente quer que os ministros viagem pelo país dando boas notícias ao povo brasileiro. É importante, sim, comemorar e comunicar boas notícias, mas sabemos também que somente isso não basta, especialmente quando (ainda) não entendemos por que a conta não fecha no azul para a maioria dos brasileiros.

Gustavo de Oliveira

Gustavo de Oliveira
Gustavo de Oliveira é empresário em Cuiabá, ex-presidente da Fiemt.
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