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Artigos | Rosana Leite

21 de março e mulheres

21/03/2022 - 09:40

O dia 21 de março deve ser um dia diferente. É uma data de enfrentamento, pois a Organização das Nações Unidas o declarou como “Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.”

Neste dia, no ano de 1960, em Joanesburgo, África do Sul, aproximadamente 20 mil pessoas realizavam um protesto pacífico contra a ‘Lei do Passe’. Respectiva norma possuía o condão de obrigar a população negra a portar um cartão que continha os locais onde era permitida a circulação. A polícia do regime do apartheid, então, abriu fogo contra essas pessoas que se encontravam na manifestação, resultando em 69 mortos e 186 feridos. A fatídica ocasião ficou conhecida como ‘Massacre de Sharpeville’. Inclusive, nesta data, na África do Sul é feriado e conhecido como o ‘Dia dos Direitos Humanos’, onde se rememora a vida daqueles e daquelas que morreram por lutar pela democracia e igualdade.

Justamente nesta data se faz importante a reflexão sobre os direitos humanos das mulheres, e porque motivo esses direitos sempre são analisados na perspectiva de raça e classe. Dentro da política de opressão capitalista as mais oprimidas são as mulheres. Analisar os direitos das mulheres é pensar plural. É saber que a multiplicidade de mulheres precisa de ser vista pela ótica interseccional. A compreensão de que em países mais carentes as pessoas mais pobres são as mulheres é premente. As mulheres negras e LGBTQIA+ são as maiores vítimas de exclusão social e violência.

Não se perfaz em boa nova que os corpos das mulheres negras são desejados, e fruto de turismo sexual. Também é sabido que existem falsas ideias de que são mais fortes que as demais mulheres, sendo preteridas em atendimentos médicos, com a falácia de serem mais resistentes e fortes a dores. A internet tem sido ferramenta para divulgação de pensamentos preconceituosos e abusos cometidos contra elas, as mulheres negras. Perfis ‘fakes’ tem sido criado para disseminar o ódio racial.

Estudo realizado pela consultoria Gestão Kairós, ano de 2021, que é especializada em diversidade, mostrou que as mulheres ocupam a posição de líderes ou gestoras apenas em 25%. Dentro dessa estatística, apenas 3% são de mulheres negras.

Durante o período pandêmico, as marcas foram profundas para a população negra e periférica. A desigualdade ficou latente, mostrando o que historicamente sempre se viu. Aquelas que tiveram que laborar como cuidadoras, a maioria negras, se viram sem a possibilidade de deixar seus filhos e filhas nas creches que se encontravam fechadas. O desemprego foi real para elas. As mulheres que conseguiram manter o seu labor fora de casa se viram envoltas nas muitas jornadas e com o temor de carregar o temível vírus para o lar. É preciso lembrar que a primeira pessoa morta no país pela SARS COVID-19 foi uma mulher negra, empregada doméstica. O elevado número de assassinatos de pessoas negras, especialmente mulheres, é resultado do historicismo e exclusão social causados pelo racismo. Por tudo, as mulheres negras estão a desenvolver com maior facilidade quadros de doenças como ansiedade, depressão, hipertensão arterial, diabetes e doenças cardiovasculares.

As mulheres negras são maioria da população nacional, porém, apenas 2% no Congresso Nacional, e menos de 1% na Câmara dos Deputados. Aliás, qual o motivo de não se chamar ‘Câmara dos Deputados e Deputadas’? Na verdade, racismo, misoginia e desigualdades devem ser temas a serem tratados incansavelmente em todos os lugares, todos os dias. Como não falar? E se não falar, como enfrentar?

Todos os anos o anuário de segurança pública mostra que as mulheres são as maiores vítimas de violência. E dentre elas, o recorte das mulheres negras as mais agredidas e maiores vítimas dos feminicídios.

Não há qualquer novidade neste artigo. O que há de novo é a visibilidade. Nada está aparecendo agora, sempre houve.  Pessoas negras agredidas em estacionamentos... Mulheres negras empregadas de brancos e brancas... Mulheres negras com baixa e péssima remuneração... Mulheres negras vítimas de abusos e estupros...

Espaços público e privado são locais de feridas e medo para as mulheres negras. Existe dúvida quanto à necessidade da política de cotas? Será que desenhando se entende?

Rosana Leite

Rosana Leite
Rosana Leite Antunes de Barros é defensora pública estadual
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